terça-feira, 5 de abril de 2011

A cooperação Brasil/Paraguai, integração sul-americana e a pequenez da oposição

O Brasil assinou com o Paraguai, em 2009, um acordo que reajusta ao valor da energia comprada do país vizinho. Está na pauta da Câmara, mas a oposição, que sempre resolve engrossar a voz com países menores, promete obstruir a votação. Como sempre, apela- à distorção e à manipulação, com o apoio de parte da mídia, para tentar jogar a opinião pública contra o governo. Apela-se a certo tipo de “patriotismo”, simplifica-se o assunto. O caso é que o governo brasileiro já declarou que o consumidor de energia não será afetado pelo acordo, cujo conteúdo leva em consideração a necessidade de cooperar com o desenvolvimento dos país vizinho, onde vivem cerca de 400 mil brasileiros e seus descendentes, os chamados "brasiguaios".

O fato é que, ao contrário do que diz a oposição, o Brasil não propõe triplicar o valor pago pela energia de Itaipu comprada do Paraguai. A tarifa de Itaipu não muda: permanecerá em US$ 43,80 por megawatt hora. A proposta é corrigir o valor da remuneração pela cessão da energia paraguaia, que passaria de US$ 3,17 para US$ 9,51 o megawatt hora. A triplicação dessa taxa garantiria US$ 240 milhões extras ao orçamento anual do país vizinho. O acordo prevê ainda a construção de uma linha de transmissão entre Itaipu e Assunção até 2012, o que amplia o potencial do Paraguai para atrair investimentos produtivos, em especial do setor industrial.

Qualquer análise a respeito desse acordo deve considerar, entre outros pontos, que interessa ao País que as nações vizinhas se desenvolvam, e o Paraguai é o país do Mercosul com o maior trecho de fronteira com o Brasil (1,3 mil km).

Em 2009, o próprio jornal norte-americano "The New York Times" reconheceu, ao contrário de segmentos da mídia e da oposição brasileira, que o acordo "é um preço pequeno" diante dos objetivos da política externa brasileira e uma medida importante para a integração regional. Ao invés de erguer muros em suas fronteiras, como fazem os EUA em relação ao México, o Brasil demonstra solidariedade e permite ao Paraguai ampliar seus programas sociais, o combate à pobreza e os investimentos em saúde e educação.

É importante frisar que a política externa brasileira , implementada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a partir de 2003 e seguida por Dilma Rousseff, leva em conta as profundas assimetrias entre nosso pais e alguns de nossos vizinhos. No passado, outros ensaios de integração não prosperaram, porque o tema das assimetrias, mesmo que formalmente reconhecido, não era efetivamente levado em conta.

Como diz o professor Marco Aurélio Garcia, assessor internacional da Presidência da República, o fato de ser maior impõe ao Brasil maiores responsabilidades. Por ter compreendido e assumido essas responsabilidades diferenciadas é que o governo brasileiro se portou adequadamente em seus relacionamentos com a Bolívia, quanto à questão do gás, ou com o Paraguai, a respeito do uso da energia elétrica, para citar dois episódios com grande repercussão e alvos da incompreensão e da oposição de alguns.

O governo Lula herdou do regime militar o acordo com o Paraguai sobre a Hidroelétrica Binacional de Itaipu e do governo FHC o gasoduto com a Bolívia. A decisão dos militares de construir Itaipu em associação com o Paraguai, arcando o governo brasileiro com a totalidade dos custos, mais que uma opção de política energética, teve clara significação geopolítica.

De acordo com a lógica daqueles tempos, diz o professor, a finalidade era atrair o Paraguai, isolando a Argentina. A resolução dos impasses daí decorrentes exigia uma saída política, muito mais do que uma solução técnica. Com esse espírito, o presidente Lula chegou aos recentes acordos com o novo governo paraguaio.

Diz ainda Marco Aurélio Garcia: “Nos dois casos, o governo Lula atuou movido pela necessidade de garantir a segurança energética do país. Mas sua atitude esteve também informada por questões de princípios. A Bolívia tinha direito à propriedade de seus recursos naturais, como o Brasil o tem e exerce. O governo Evo Morales pagou pela nacionalização das instalações da Petrobras, contrariamente ao que tantas vezes a oposição e parte da imprensa propalaram. O presidente Lula teve compreensão sobre a simbologia que as demandas bolivianas e paraguaias apresentavam nos dois países. Elas apareciam como instrumentos de coesão social e política, capazes de alimentar projetos de desenvolvimento nacional que os libertassem da situação de países dependentes de um só produto. Pela mesma razão, o Brasil também tem se empenhado na diversificação da economia desses e de outros países da região, com o objetivo de reduzir assimetrias e dependências” .

Não deixa de ser sintomático que muitos dos que criticaram a suposta “tibieza” da diplomacia brasileira para com a Bolívia e o Paraguai – não raro com argumentos racistas, ou querendo ver preferências ideológicas – tenham sido, no passado, os mesmos que pregaram e praticaram a mais absoluta subserviência em relação às grandes potências. As preferências ideológicas eram outras. O Brasil fez uma opção clara. Não quer ser um país próspero em meio a um conjunto de países pobres e desesperançados quanto a seu futuro. A altivez não é incompatível com a solidariedade. E a solidariedade também serve ao interesse nacional, que muitos invocam sem efetivamente compreender o que venha a ser”.

ENERGIA E DESENVOLVIMENTO - Itaipu é maior hidrelétrica do mundo em geração de energia. Em 2008, essa represa gerou 95 mil gigawatts-hora de energia. Desse total, o Brasil consumiu 95% e o Paraguai apenas 5%. Para o nosso país, Itaipu é responsável por 20% de toda energia consumida. Já para o Paraguai, esse percentual chega a 95%. Portanto, não fosse Itaipu, tanto Brasil quanto Paraguai enfrentariam sérios estrangulamentos em seu suprimento de energia e, consequentemente, em seu desenvolvimento econômico.

O orçamento anual da Itaipu Binacional é de US$ 3,3 bilhões. Desse total, a parte brasileira recebe US$ 200 milhões em royalties, US$ 25 milhões a título de rendimentos de capital e US$ 15 milhões em encargos de administração. A parte paraguaia também recebe os mesmos US$ 200 milhões em royalties, US$ 25 milhões em rendimentos de capital e US$ 15 milhões em encargos de administração. Há, contudo, uma diferença. O Paraguai recebe, ademais dos pagamentos feitos sob essas rubricas, US$ 120 milhões a título de remuneração pela cessão de energia. É que, por força do artigo XIII, parágrafo único, do Tratado de Itaipu, cada uma das Partes se obriga vender a outra Parte a energia que não utilizar. Como Paraguai utiliza apenas 10% da energia de Itaipu a que tem direito, o restante é vendido ao Brasil.

Pois bem, a modificação ora proposta pelo acordo diz respeito somente a essa remuneração pela cessão de energia paga ao Paraguai. Ao todo, essas remunerações, tanto da Parte brasileira quanto da paraguaia, ascendem a US$ 600 milhões. De outro lado, a Itaipu desembolsa outros US$ 600 milhões com custeio e investimentos vários. Sobrariam, em tese, ao redor de US$ 2,1 bilhões do orçamento da empresa para serem distribuídos às Partes. Contudo, esse dinheiro sobrante está todo comprometido com o pagamento da rolagem da dívida de Itaipu. Assim, cerca de 64% da receita da Itaipu Binacional são destinados à amortização de dívidas, o que limita bastante a remuneração pela energia gerada.