terça-feira, 31 de julho de 2012

Redução dos juros no Brasil, uma conquista a ser celebrada

  A redução da taxa de juros no Brasil, num processo virtuoso iniciado há quase um ano, deve ser celebrada como um dos principais feitos do governo Dilma Rousseff.  Mas esta conquista histórica do país -- é a menor taxa de juros em quase vinte anos -- tem gerado críticas dos rentistas e operadores de mercado que sempre ganharam dinheiro com a especulação e compra de títulos do governo. Essas ponderações são do economista e professor de Economia Delfim Netto, em artigo publicado na edição desta semana da revista Carta Capital. Ele lembra que até a mídia global passou a agir com má vontade com o Brasil, dando espaço às desmoralizadas agências de "avaliação de risco", que têm inflado o noticiário com "análises" negativas sobre a economia brasileira.
Leia a íntegra do artigo, intitulado "Uma data a festejar":

"Se tivermos de fazer o registro de uma data importante no governo Dilma, a primeira escolha para mim é 31 de agosto de 2011, o dia em que o Banco Central iniciou um virtuoso processo de redução dos juros na economia brasileira, trazendo em um ano a taxa básica de 12,5% para os atuais 8%, a menor dos últimos 192 meses.

Nos primeiros movimentos após aquela decisão do Comitê de Política Monetária (Copom), a reação dos mercados financeiros foi cautelosa: seus analistas custaram um pouco a perceber os próximos lances do processo, mas, quando se tornou evidente a profundidade dos cortes, o tom dos comentários azedou em relação ao governo.

Eles cederam diante da dura reação da presidenta Dilma em rede nacional de tevê, ao mostrar que a queda dos juros era uma exigência vital (e moral) para sustentar o crescimento econômico e a estabilidade social. C) discurso deixou meridianamente claro que baixar a taxa de juros real no Brasil ao nível internacional é fundamental para a aceleração do desenvolvimento.

A crítica cedeu, mas o azedume apenas mudou de foco, importando amostras do pessimismo armazenado nos porões das desmoralizadas agências de "avaliação de risco" para inflar o noticiário ciu opiniões negativas sobre a economia brasileira. Uma súbita mudança na mídia global que surpreendeu muitas pessoas, mas não o jornalista Paulo Sotero, veterano correspondente internacional que hoje dirige o Instituto Brasil do Wilson Center, em Washington, que fez um inteligente comentário que tomei a liberdade de extrair do brilhante ensaio produzido pelo doutor em comunicação pela USP, Carlos Eduardo Lins da Silva, publicado no recente suplemento Fim de Semana, do Valor.

Diz o bem informado Paulo Sotero: "A percepção de que o Brasil era um sucesso e agora virou um fracasso vem do noticiário econômico e reflete opiniões de analistas do mercado". Esses, em geral, "emitem juízos de valor que têm um tom definitivo, que vêm geralmente acompanhados de preleções, são invariavelmente tardios, para o bem ou para o mal, exageram e não constituem análises neutras ou isentas, pois refletem os interesses imediatos das instituições que as divulgam, de produzir resultados a seus clientes".

Sotero cita, como exemplo, que "a euforia do mercado com o Brasil virou zanga, quando o governo reintroduziu controles de capitais para fazer frente à valorização do real e o Banco Central passou a executar uma estratégia agressiva de redução dos juros, sem produzir os efeitos inflacionários que os analistas previram".

A observação sobre as reações (a zanga) do mercado quando o Brasil acusou os países desenvolvidos (EUA e os "grandes" europeus, Alemanha e Holanda) de práticas que levariam a uma "guerra cambial" é pertinente. Basta lembrar a surpreendente tentativa do sistema financeiro de culpar o Brasil pela guerra "por exagerar na manipulação da sua moeda"! E ainda vetar a discussão do problema na Organização Mundial do Comércio (OMC). O que não conseguiram, finalmente, pois a Organização acabou aceitando discutir a questão da "guerra cambial" em uma próxima reunião.

Nem o governo nem o cidadão brasileiro e, particularmente, os empresários podem se deixar amedrontar pelo pessimismo exibido pelos "analistas financeiros" que pretendem inibir investimentos na produção, intimidar os consumidores e acovardar o nosso sistema bancário.

Quatro anos se passaram desde o início da crise mundial desencadeada pela falência do Lehman Brothers, que paralisou a economia americana e jogou luz sobre os malfeitos dos governos europeus envolvidos com as fraudes que eles próprios facilitaram nos mercados financeiros. A cada mês, a cada semana, surgem novas revelações confirmando que uma parte do sistema financeiro internacional transformou-se em uma fonte inesgotável de patifarias. Sem notícia de punições.

Os mais recentes vexames envolvendo o previsível J.P. Morgan e o inacreditável procedimento envolvendo a manipulação da Libor e do índice Euribor, usados como referência para as taxas de juro nos mercados britânico e europeu, talvez despertem uma forma nova de reação.

E o que vai ser interessante conferir após as declarações, nesta semana, do comissário europeu de Serviços Financeiros, Michel Barnier, apontando "falta absoluta de valores morais" de parte dos agentes financeiros e defendendo "punições sem nenhuma desculpa, inclusive com a prisão, nos casos mais graves".
Antonio Delfim Netto