quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Lições do Código Florestal


 No artigo abaixo, o deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP) aborda os desafios para o estabelecimento de um Código Florestal que concilie os interesses do meio ambiente com a produção agrícola. Ele lamenta o fato de os  partidos de oposição terem se alinhado aos ruralistas mais radicais para impor uma derrota ao governo, durante a tramitação da matéria, no primeiro semestre. Agora, ele aposta no diálogo para que seja aprovada a Medida Provisória 571, em tramitação na Câmara dos Deputados. Leia a íntegra do artigo:
O plenário da Câmara pode votar ainda esta semana a medida provisória que regulamenta o novo Código Florestal. Acordo fechado na comissão especial deve encerrar uma disputa entre ambientalistas e produtores rurais que se arrastava no Congresso há pelo menos 13 anos. Além de uma legislação ambiental equilibrada, a decisão nos oferece importantes lições. Num tema historicamente contaminado pelos fundamentalismos, cada lado cuidou de afirmar suas posições sem dar espaço para o diálogo. O setor rural reclamava mudanças na legislação que tirassem os produtores da ilegalidade, enquanto os ambientalistas exigiam garantias para o meio ambiente. Os dois lados estavam certos.

Segundo o Banco Mundial, a partir de 2050 será preciso elevar em 80% a atual produção mundial de alimentos para abastecer toda a população. Ao mesmo tempo, as mudanças climáticas provocadas pelas agressões ao meio ambiente já comprometem a produtividade de várias lavouras, conforme alerta da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO). O Brasil está no centro desse desafio. É o país com maior potencial de aumento na produção de alimentos e ao mesmo tempo detém as maiores reservas naturais do planeta.

Coube ao Congresso o papel de interferir para mediar o debate e conciliar as visões dos dois grupos. Infelizmente, reduziram a discussão do novo Código Florestal a uma disputa política. Os partidos de oposição se alinharam aos ruralistas mais radicais para impor uma derrota ao governo. A matéria acabou sendo vetada.

O assunto voltou na forma da medida provisória. Ficou claro, dessa vez, que não estava em jogo a vitória do governo ou da oposição, mas a necessidade de escrever uma lei ambiental adequada para o país. Nem permissiva a ponto de ameaçar nosso patrimônio natural; nem restritiva a ponto de inviabilizar o setor produtivo. Após concessões de lado a lado, chegou-se a um entendimento sem precedentes entre os setores ligados ao meio ambiente e à produção rural.

Com apoio de quase todos partidos, a negociação permitiu superar as duas principais divergências—a recomposição de áreas de preservação permanente (APPs) de margens de rio para pequenos e médios proprietários e a conversão das multas para quem desmatou irregularmente áreas de preservação. 

Nesse caso, os produtores terão de se inscrever nos programas de regularização ambiental a serem instituídos pelos estados. A reforma do código florestal pretendeu solucionar um dilema que ultrapassa nossas fronteiras: como será possível enfrentar a fome no mundo (hoje e no futuro) e proteger o meio ambiente? Podemos dizer que nenhum país até hoje conseguiu responder a isso. O Brasil, agora, poderá assumir a vanguarda da economia verde.

Além de superar um desafio tão complexo, todo esse processo deixa duas grandes lições. Primeira, os obstáculos para as grandes reformas que o país precisa implementar, por maiores que sejam, podem ser superados. Segunda, a de que, para isso, é preciso valorizar o diálogo. A construção do consenso é o melhor caminho para as mudanças. Esse é o papel do Congresso Nacional.



(Artigo publicado no Jornal Brasil Econômico em 4/9/12)